Tinha eu 15 anos de idade, era afixionado em rock. Conhecia muito, em especial, as bandas inglesas e americanas, e um pouco as brasileiras.
Refazenda foi me apresentado nesse contexto. De imediato foi um grande fascínio. O rock abriu a minha sensibilidade para entra na sonoridade eclética de Gilberto Gil.
Rezazenda lançado em 1975 é para mim o ponto de convergência e proliferação de muitas referênicias na formação cultural do Giló, como os amigos íntimos o chamam.
O prefixo Re, remete a religar, reconectar e (re)existir. Gil nasceu em Salvador, mas passou sua infância em Ituaçu, no sertão baiano.
O disco é uma reconexão com esse passado sertanejo, mas conectado a efervescência dos anos 70.
O sertão nesse disco é o mundo multifacetado desse músico e compositor extraordinário. Que constrói pontes entre Luiz Gonzada, Stevie Wonder, Bob Marley e os Beatles, como vários outros.
O menino que começou na música tocando acordeão convidou Dominguinhos, o princípal discípulo de Luiz Gonzaga. Dominguinhos toca em todas as faixas. Músicas articuladas numa sequência primoroza, que continua a arrebatar o meu coração caipira-roqueiro, em cada sessão de vinil que coloco em minha casa.
Ela, Tenho Sede (traga-me um copo d’água tenho sede), “Abacateiro acataremos o seu ato, nos também somos do mato, como pato e o leão…”, “Eu passei muito tempo aprendendo a beijar outros homens, como beijo o meu pai…”, “Nos meus retiros espirituais…”, O rouxinol (música de Jorge Mautner, grande referência de Gil), Lamento sertanejo (a minha música predileta de Gilberto Gil), linda, maravilhosamente tocada, acompanhada por Dominguinhos.
A capa e a contra-capa do disco são belíssimas. Desvelam a polissemia desse negro baiano deslumbrado pela diversidade do mundo. Sentado com seu kimono azul, cor da sua devoção, comendo de hashi e na órbita imagens da brasilidade profunda de um pai amoroso. Assim como na contra-capa uma rede de pesca como mosaico de imagens que representam e dão o tom das múltiplas relações estéticas presentes nas músicas.
Refazenda dá um pontapé inicial a mais bela trilogia musical da música brasileira: Refazenda, Refavela e Realce.
Evoé Gilberto Gil! O músico músico mais eclético da sua geração.
Cristiano Barbosa
é cineasta, fotógrafo, produtor cultural, educador, geógrafo e colecionador de vinil.
@cristiano_barbosa_