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Angelus

Descobri o álbum Angelus de Milton Nascimento em 1993 quando estava à venda em uma grande loja popular, era um vinil duplo que havia acabado de ser lançado. E, o que primeiramente chamou-me a atenção foram os nomes dos artistas na contra capa: Jon Anderson, João Batista, Leonardo Bretas, Ron Carter, Jack Dejohnette, Hugo Fattoruso, Peter Gabriel, Gil Golstein, Herbie Hancock, Wilson Lopes, Pat Metheny, Túlio Mourão, Wayne Shorter, Robertinho Silva, Ronaldo Silva, Vanderley Silva, James Taylor, Naná Vasconcelos e Flávio Venturini. — Que isso? — Exclamei comigo mesmo. — Um Clube da Esquina e agora internacional? — levei o disco na hora.

Chegando em casa coloquei o disco pra tocar e, enquanto ouvia, coloquei-me a apreciar o material gráfico e a ficha técnica da obra.

A capa é assinada pelo fotógrafo Márcio Ferreira e o designer gráfico Geraldo Leite. Nela, aparecem quatro anjos fotografados de esculturas do Mestre Ataíde e do Aleijadinho que estão nas cidades Mineiras de Congonhas, Santa Bárbara, Caeté e Ouro Preto. As fotos manipuladas com computação gráfica foram coladas sobre um fundo laranja com o trecho de um manuscrito de Tiradentes. No encarte, dentre as poucas imagens presentes há um detalhe de uma pintura de Jean-François Millet, feita em meados do século XIX, intitulada Angelus, que está colocada junto à ficha técnica da música homônima e que também dá nome ao álbum. O título “Angelus” refere- se à oração, também de mesmo nome, que se pratica no toque das trindades correspondente às 6h da manhã, ao meio dia e às 6h da tarde, para relembrar a Anunciação, o momento em que o Anjo Gabriel anuncia a Maria que ela seria mãe de Jesus, o salvador.

Outra pequena imagem chama a atenção: a foto de Ailton Krenak, feita em 4 de setembro de 1987, quando subiu à tribuna da constituinte da Assembleia Nacional para protestar contra emendas do agronegócio que seriam um retrocesso ao desenvolvimento do país e à luta dos povos originários. Krenak trajava um terno branco e, enquanto discursava, pintava o rosto com tinta preta de jenipapo. O registro desse momento histórico que levou à aprovação dos artigos 231 e 232 da Constituição de 1988 vem junto à letra de Estrelada, uma música em que Milton canta em dueto com o vocalista da banda Yes, Jon Anderson, cuja a letra, toda em português, tratando de nossa grande mãe, o planeta Terra, reza: os teus homens não tem juízo / esqueceram tão grande amor / ofereces os teus tesouros / mas ninguém dá o teu valor. Ainda, no encarte, junto ao detalhe de uma das “paisagens imaginantes” de Alberto Guignard, um chamado: “Só temos 10 anos para salvar nosso planeta. Começa com você e é fácil. Use produtos seguros para o meio ambiente. Pressione líderes políticos. Ame e respeite toda forma de vida. Economize energia. Seja solidário. Recicle”. Mas, de 1993, já se passaram 29 anos e não se fez nada suficiente para que hoje, 2022, não estivéssemos dentro do aquecimento global e já sofrendo suas consequências com eventos climáticos extremos.

Em janeiro de 2011, Milton Nascimento declarou que Angelus é seu álbum favorito.

E nesse quintal do mundo curado pelo Bituca, as músicas cultivam encontros, muitos entre regionalidades que criam o universal. A música “Coisas de Minas”, se faz do encontro estético de viola caipira, do ritmo do calango, do jazz à moda da MPB – com “p” de progressivo – Música Progressiva Brasileira. Em 2019, em um texto do jornal Folha de São Paulo, o músico bandolinista, Hamilton Holanda comentando sobre Angelus diz: “O mundo ideal, que imagino, é aquele em que as fronteiras sirvam só para valorizar o que é local de forma complementar com a valorização daquilo que é comum a todos. A música de Milton sempre me fez estar em contato com esse sentimento: de que eu tenho minha pátria e

minha língua, mas existem outras também imensamente interessantes, e o que vale a pena é juntar tudo isso em um mundo só”. – Que diria John Lennon.

Angelus de Milton Nascimento é esse amálgama de coisas do mundo e de coisas de Minas que faz um clube da esquina para as coisas mais bonitas e importantes da vida.

Eduardo Bernardt

é uberlandense e se graduou em matemática pela UFU em 2003, mesma universidade na qual se graduou nos cursos de licenciatura e bacharelado em teatro. Atuante em projetos culturais nas mais diversas áreas.

 @edu.bernardt

Milton Nascimento - Angelus

Vigésimo quinto álbum do cantor e compositor Milton Nascimento com fotos de Tom Tavee, fotografia das paisagens mineiras de Guignard, reproduções de Márcio Ferreira e capa de Geraldo Leite e Márcio Ferreira. A música “Angelus”, que dá nome ao disco, foi gravada com Leonardo Bretas para a trilha da novela Coração de Estudante da Rede Globo em 2002. O LP duplo tem 15 faixas e 1h09min de duração.

Lançamento1993ArtistaMilton Nascimento participação especial de artistas internacionais como Pat Metheny, Jon Anderson, Wayne Shorter, Herbie Hancock, James Taylor e Peter GabrielGravadoraWarner Music Brasil/MBG Ariola DiscosGravaçãoFazenda Grotão (Esmeraldas – MG) com produção executiva de Márcio Ferreira e Matt Pierson e direção musical de Milton NascimentoGênerosMPB e jazzCompartilhar
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