Bezerra da Silva lançou em 1985 um disco chamado “Malandro Rife”. Na capa, ele aparece com um revólver calibre 38 e com o dedo no gatilho, olhar bem intimidador. Ele estampa um tipo de herói protetor da comunidade, e em algumas letras ele próprio já se coloca como repressor de quem se atrever a fazer covardia com o morador da favela.
A capa tem aquela estética de filme em cartaz, estrelando Bezerra da Silva, as aventuras do malandro. O estilo cartaz de cinema passa a ideia de um possível enredo, assim na minha opinião, de um filme no estilo de Shaft, Jackie Brown, e aí seria um filme que também mistura gênero “tela class”, super cômico. A gente tem que lembrar que são vários os personagens impagáveis que o Bezerra criou, e nesse disco por exemplo a gente tem a história do Zé Fofinho de Ogum, da avó que planta arruda de guiné, são todos descritos em versos bem curtos e super bem bolados.
Esse malandro é bem diferente do malandro cantado por Chico Buarque, da boemia. O do Chico muitas vezes se finge de otário e vai galgando terreno – dependendo da dedicação, ele vira candidato a malandro federal. O do Bezerra se coloca como guardião do morro, pronto pra ocupar o espaço que o Estado deixou vazio.
Acho que ao longo dos anos, essa malandragem raiz também foi se modificando. No disco “Eu Não Sou Santo”, que é de 1990, o choque de realidade aparece na foto do malandro pregado na cruz no alto da favela, braços abertos com um revólver de cada lado e uma cartucheira no ombro, cheia de munição. Atualmente até o tipo de armamento é outro, né. Mas essa divagação não prejudica o valor de época do “Malandro Rife”, principalmente pra quem admira e sempre vai admirar um bom samba de partido alto, de instrumental genuíno, com letras simples e diretas, que vão além da irreverência. Bezerra da Silva não precisa fazer a cabeça, pois como o próprio já disse, ele já nasceu com ela feita.